Álvaro Krüger, de Porto Alegre (RS)

 

Medalhista em 2005, quando participou da OBMEP no 3º ano do Ensino Médio, gaúcho foi o primeiro aluno do PICME a fazer Mestrado e acaba de ser aprovado no concurso para professor da UFRGS.


Quando o então adolescente Álvaro Krüger foi puxado para dentro de uma sala de aula durante o intervalo de suas aulas no terceiro ano do Ensino Médio, em 2005, mal sabia ele que sua vida mudaria tanto. Ele e um amigo andavam pelos corredores do Instituto de Educação General Flores da Cunha, em Porto Alegre, quando um professor os viu vagando e gritou seus nomes. "Ele disse que ia começar a aplicar uma prova da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas, uma competição nacional. Naquela época, eu não fazia a menor ideia do que se tratava a prova, mas aceitei pelo desafio", conta.

 

Deu certo: a participação na primeira edição da OBMEP rendeu a Álvaro uma medalha de prata e o início de uma carreira acadêmica na área. “Primeiro veio o orgulho da família, dos meus pais, tios, tias e avós. Em segundo lugar, veio o PIC, uma experiência formidável que definitivamente mudou os rumos da minha vida”, recorda. 

 

Gaúcho da capital, Álvaro tem 27 anos e concluiu este ano o doutorado em Matemática na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Sua primeira opção de faculdade, no entanto, foi bem diferente: escolheu no vestibular o curso de Direito. “Não tinha nada a ver comigo, era muito chato, precisava decorar opiniões diferentes sobre a mesma coisa. Na Matemática ou é verdade ou não. Ela não mente, ao passo que no Direito tudo é relativo”, explicita Álvaro, que voltou recentemente para o Rio Grande do Sul após um período no Rio de Janeiro onde fez um curso no Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (IMPA). 

 

“Ele sempre foi um ponto fora da curva, um aluno com uma sensibilidade diferenciada para a Matemática”, conta Renan Xavier, o mesmo colega de classe que foi chamado junto com Álvaro para participar da prova da OBMEP. Os dois estudaram durante o Ensino Médio e dividiram as mesmas salas de aulas também na faculdade. Mesmo cursando Direito, Álvaro se matriculou em matérias de exatas, como Cálculo, por exemplo, e fazia as aulas com o amigo. Os dois travavam uma competição saudável, lembra Álvaro. “Sempre víamos quem tirava a nota mais alta. A diferença nunca foi muito grande - um tirava 9,5 e o outro 9”. A aptidão se revelou mais tarde no campo profissional. Álvaro se tornou matemático e Renan estatístico.

 

Renan lembra do amigo como um jovem acima da média: “Uma vez, ainda no Ensino Médio, ele ficou andando por uns dois dias com folhas na mão e descobri que ele estava tentando derivar a Fórmula de Bhaskara. Para alguém já na universidade, pode ser um cálculo não muito difícil, mas foi surpreendente ver um jovem daquela idade chegar sozinho à resposta. Ele fazia isso com frequência. Utilizando o raciocínio lógico, chegava às fórmulas dadas em classe”.

 

Segundo o próprio Álvaro, a graça da Matemática está em compreender as histórias e o raciocínio lógico por detrás das fórmulas. “Assim, você nem precisa decorar. É só entender como se chegou àquele cálculo”. Foi por conta desta habilidade que ele decidiu trocar de curso após um ano de matrícula e investir na Matemática Avançada. Logo, faria parte da primeira turma do Programa de Iniciação Científica e Mestrado (PICME), que oferece a oportunidade de realizar estudos avançados em Matemática simultaneamente aos da graduação, recebendo para isso uma bolsa de estudos. Dele participam universitários que ganharam medalhas na OBMEP e na OBM durante o Ensino Fundamental e Médio.

 

Com a bolsa, foi possível se dedicar mais aos estudos do Mestrado. Álvaro morava sozinho e dava aulas particulares para conseguir custear sua vida na capital gaúcha, o que deixou de fazer assim que entrou para o PICME. “Mas o que eu mais gostava mesmo era de ter acesso à tão sonhada sala da pós-graduação”, lembra. A referida sala era um espaço da UFRGS reservado para os alunos da pós-graduação, onde era possível trocar experiências com pesquisadores mais avançados e professores disponíveis. “Esses contatos foram a chave para eu me adiantar na graduação e depois no Mestrado e Doutorado”.

 

Outro ponto que acelerou sua trajetória acadêmica foi um intercâmbio que fez na Espanha, onde passou um ano estudando, na Universidade de Granada. O orientador da universidade estrangeira, Joaquín Pérez, elogiou a dedicação de Álvaro. “Ele tem um interesse vívido pela Matemática e muita intuição. Quando trabalha, fica claro que gosta de fazer Matemática, e isso indica que terá uma carreira promissora”.

 

Filho de professores, ambos lecionando em colégios públicos de ensino básico - ou “heróis”, como ele mesmo define a profissão -, Álvaro pretende seguir a linha da família, mas desta vez no Ensino Superior. “Nos últimos anos, foi amadurecendo o desejo de ser professor da UFRGS, e estou muito feliz por ter passado em um concurso recentemente, com louvor”, comemora. Ele espera que outros estudantes sigam um caminho semelhante ao dele, e elogia a OBMEP por ser uma porta de entrada para os jovens conhecerem a matemática “em seu estado mais criativo”. 

 

Segundo Álvaro, muitos jovens bons em Matemática acabam indo para outros cursos pelo simples fato de não conhecerem as possibilidades inerentes à profissão de matemático. “Muitas pessoas não têm noção do que se faz na área de pesquisa. Há estudantes de Ensino Médio que acabam optando por Ciências da Computação ou Engenharia por não saberem o que se faz na faculdade e pós-graduação de Matemática. Também nesse ponto, a OBMEP e depois o PIC estão sendo geniais, porque não há forma melhor de captar talentos e apresentar a eles o gosto pela pesquisa”, explica. 

 

Ele mesmo optou primeiro por um curso com o qual não se identificou e, ainda antes, no Ensino Fundamental, não considerava em nenhum momento ser matemático. “Passava pela minha cabeça fazer Engenharia Química, ser um cientista louco”, ri o jovem, que sonha com o dia em que a Matemática terá “popularidade suficiente para atrair mais talentos”.

 

Álvaro lembra que é exatamente nessas primeiras fases da formação escolar, por volta dos seis, sete anos, que as crianças passam a reproduzir aversão e medo da matemática absorvidos de gerações anteriores. “Muitos pais não têm afinidade com a matéria, acham-na difícil demais, e deixam isso transparecer, o que influencia o processo de aprendizado dos filhos. Para reverter esse quadro, deveríamos focar nas crianças das séries iniciais e mostrar o quanto a disciplina pode ser divertida”, aconselha o agora orgulhoso professor da UFRGS.




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