Mais de 18 milhões de crianças e adolescentes se reúnem, anualmente, para colocar à prova seus conhecimentos em matemática. Além de promover a popularização da disciplina, considerada o “bicho papão” dos jovens, a Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP) é uma porta de entrada para programas educacionais e oportunidades que mudam a vida dos participantes. Realizada pelo IMPA desde 2005, a OBMEP mobiliza jovens de mais de 54 mil escolas públicas e privadas em 99% dos municípios do país.
A maior olimpíada científica do Brasil surgiu para identificar jovens talentosos e estimular o gosto pela matemática. “A OBMEP tem uma capilaridade extraordinária, já que alcança a quase totalidade dos municípios brasileiros. Dessa forma, leva oportunidades de vida para os nossos jovens em todo o território nacional, de forma muito equânime e social. Do ponto de vista do IMPA, isso representa uma oportunidade excepcional para expandir o escopo da nossa atuação”, comenta Marcelo Viana, diretor-geral do instituto.
No ano de sua estreia, em 2005, a expectativa era que a olimpíada alcançasse cinco milhões de estudantes. Mas o projeto teve uma adesão muito maior do que o esperado, totalizando mais de 10 milhões de inscritos. Esta gigante da matemática foi crescendo e, em 2017, passou a incluir também alunos de escolas particulares. Ao longo dos anos, se consolidou como uma das mais bem-sucedidas políticas públicas em educação do país.
E não faltam provas que atestam o efeito benéfico da iniciativa. Um estudo da Universidade de Harvard mostrou que o efeito de ser premiado na competição beneficia não apenas o ganhador, mas também seus colegas de turma.
Outro estudo, desta vez da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mostrou que escolas envolvidas com a OBMEP oferecem o equivalente a 1,5 ano a mais de matemática aos alunos. O bom desempenho nesta área se deve, em partes, aos grupos de estudo que são formados nas instituições de ensino conforme elas vão se engajando com a competição.
Abrindo portas para a educação
Os alunos premiados pela OBMEP passam a ter acesso a um novo mundo, no que são incentivados a aprofundar os estudos. Convidados a participar do
Programa de Iniciação Científica Jr. (PIC), os medalhistas comparecem às aulas de matemática em instituições de ensino superior da sua região e os estudantes de escolas públicas recebem uma bolsa de R$ 100.
Em casos de famílias de baixa renda, o auxílio cobre a mensalidade de internet da casa ou outros materiais de estudo.
É o caso do alagoano Wellington de Souza, que estudava à luz do poste quando a energia de sua casa, na periferia de Maceió, foi cortada. Apesar dos percalços, conquistou uma medalha de prata e sua história de superação ganhou os noticiários. Sua mãe, Teresinha Medeiros Leite, era catadora de material reciclável e não foi alfabetizada. “Eu falava pra ele. Meu filho, eu não tenho estudo. Você vai ter. Eu cato reciclagem, porque eu não estudei. Ele sabe disso. Pra mim é uma vitória”, afirmou Teresinha para reportagem da TV Gazeta.
A repercussão do caso gerou uma corrente de mobilização para ajudar a família. A energia da sua residência foi restabelecida e Wellington passou a receber roupas e cestas básicas. Com a base matemática que ganhou ao participar do PIC, Wellington foi aprovado no vestibular da Fundação Getúlio Vargas (FGV), onde cursa matemática aplicada, com bolsa integral de estudos. São diversos os casos de medalhistas que, por conta do envolvimento com a OBMEP, têm acesso à graduação, experiências internacionais e realização profissional.
O cearense Orisvaldo Salviano Neto e o paulista Pedro Lucas Lanaro Sponchiado, ambos medalhistas, foram aprovados para uma das mais prestigiadas instituições de ensino do mundo, o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês), em 2019. Katarine Klitzk, natural de Timbó (SC), é outro exemplo de sucesso da olimpíada. Após sucessivas premiações, foi aprovada para estudar engenharia da computação, astrofísica e inteligência artificial na universidade Georgia Institute of Technology, nos Estados Unidos.
Primeiro passo para trajetórias de sucesso
O IMPA também promove o Programa de Iniciação Científica e Mestrado (PICME), destinado aos medalhistas da OBMEP que cursam a graduação em universidades públicas.
Os participantes têm a oportunidade de realizar estudos avançados em matemática simultaneamente com sua faculdade e recebem bolsas de R$ 400, através de uma parceria com o CNPq (Iniciação Científica) e com a CAPES (Mestrado e Doutorado).
A olimpíada ainda premia professores e escolas que tenham engajado alunos com as olimpíadas e melhorado seu desempenho na competição. É o caso de Francimario Souto Medeiros, que tem uma história de longa data com a OBMEP. Natural de Várzea (PB), Francimario coleciona premiações, como aluno e professor. Após a conquista de uma medalha de ouro, uma de bronze e duas menções honrosas, contou com as bolsas do PIC e do PICME para se formar em matemática, na Universidade Federal de Campina Grande (UFCG).
Atualmente, é professor da Escola Cidadã Integral Técnica Professor Bráulio Maia Júnior, de Campina Grande. Devido ao bom desempenho de seus alunos na OBMEP, foi convidado a participar do
Programa OBMEP na Escola, que contribui para a formação de professores em matemática e estimula a adoção de novas práticas didáticas em suas salas de aula. “Fiquei muito emocionado! É um ciclo que está se renovando e sinto que posso contribuir para outros alunos terem o conhecimento e a oportunidade que eu mesmo adquiri!”, comentou.
Universalização do ensino de qualidade
Este ano, o IMPA está lançando a 1ª Olimpíada Mirim – OBMEP, para identificar talentos da matemática do 2º ao 5º ano do Ensino Fundamental. Esta é a primeira competição científica nacional voltada para alunos tão jovens de escolas públicas.
Como explica Landim, o objetivo é incentivar o ensino da matemática e transformar a relação das crianças com a disciplina nas séries iniciais, introduzindo aspectos criativos e lúdicos no processo de aprendizagem. “No país, o gargalo do ensino da matemática se situa nos primeiros anos escolares e é um desafio elaborar perguntas instigantes para alunos que ainda estão em alfabetização”, afirmou.
Viana comenta que uma das prioridades estratégicas do IMPA é a universalização da OBMEP no universo escolar. “Isso passa, em primeiro lugar, pela extensão ao ciclo inicial, com o lançamento da Olimpíada Mirim. Isso é extremamente importante, pois é sobretudo nestas idades que se cristaliza a relação da criança com a matemática. Mas a universalização vai mais além, focando também em ações de incentivo à participação em regiões e populações mais carentes”, afirmou.